Cidadãos engajados e “apaixonados” podem encontrar a ponte entre os problemas sociais e as soluções.

Comunidades, empresas e governos podem realmente criar um ambiente para mudança social

A democracia está em colapso. O Índice da Democracia 2016 da Economist Intelligence Unite (EIU)* mostra que 72 países experimentaram um declínio nos valores democráticos no ano passado. De acordo com o ranking, mais de um terço da população mundial (2,6 bilhões de pessoas) vive sob algum tipo de ditadura e apenas 8,9% vivem em “democracias completas”.

E quando falamos de Brasil, lamentavelmente nosso país teve a pior colocação da história e se encaixou na categoria de “democracia falha”, ficando atrás de diversos vizinhos latino-americanos, de países africanos e mesmo do Timor Leste, nação asiática independente há apenas 14 anos. O dado reflete o estado de degeneração da política nacional, evidenciada pelos históricos e recorrentes escândalos de corrupção. E embora o paradigma de impunidade venha mudando com a Operação Lava-Jato, ainda é lento o reflexo na imagem política do Brasil e no resgate da crença na democracia.

Claramente grande parte do mundo está experimentando uma crise profunda de confiança nos sistemas democráticos e questionando a relevância de ações políticas tradicionais. Porém, concordando com Winston Churchill que “a democracia é o pior dos regimes políticos, mas não inventaram um melhor para substituí-la”, o nosso desafio enquanto humanidade é reinventá-la. E o momento ideal para um engajamento cívico criativo é agora!

Alguns movimentos vêm esboçando uma reação. Um número cada vez maior de novas tecnologias está disponível para assegurar mais participação de cidadãos da vida pública. Indivíduos estão se apropriando desses recursos para a construção de um diálogo focado na resolução de problemas sociais pela colaboração. Mas ainda é pouco!

Estamos falando de criar um novo ecossistema de empreendedorismo cívico. No estado atual da humanidade, o empreendedorismo cívico representa um passo civilizatório de organização e de melhoria da sociedade. Estamos num momento da história no qual há um espaço político-institucional com oportunidades em aberto para movimentos e cidadãos comprometidos com a criação de países mais democráticos, justos e éticos.

E é isso que estão fazendo, por exemplo, os criadores da Rosie, um robô (software) que identifica o mau uso da verba pública por deputados federais e os denuncia. Ou a Fundação Avina e a Omidyar Network, que acabam de lançar a Aliança Latino Americana para a Tecnologia Cívica (Altec) e abriram seu primeiro edital para financiamento de startups cívicas no Brasil. Essas iniciativas de fomento à criação de tecnologias cívicas transformam ação em impacto significativo, por meio da promoção da participação cidadã e da institucionalidade democrática.

E cabe uma menção especial à Rede de Ação pela Sustentabilidade (Raps), entidade civil que tem uma atuação importante na criação desse novo ecossistema do empreendedorismo cívico, fomentando o resgate do senso político dos cidadãos e o estímulo à participação efetiva na política. Precisamos inspirar uma nova geração de empreendedores cívicos, de gente de bem, comprometida com o bem comum e com a excelência em gestão, para que ocupem posições, seja nos três poderes, seja em secretarias ou outras instituições públicas. É preciso que esses cargos políticos sejam ocupados por gestores (independentemente se empresários ou não) que, além da preocupação pela excelência em gestão, tenham um pacto real com a transformação social, baseada em valores, na ética e na transparência.

Cidadãos engajados e “apaixonados” podem encontrar a ponte entre os problemas sociais e as soluções. As comunidades, empresas e governos podem realmente criar um ambiente para mudança social. E todos nós podemos ser esses agentes de transformação, empreendendo civicamente para resgatar o Brasil do retrocesso democrático. O desafio está feito, quem vai responder sim? Engaje-se em um movimento cívico na sua cidade!

Rodrigo Baggio é empreendedor social, fundador e presidente da ONG Recode (antigo Comitê para a Democratização da Informática)

* Retirado originalmente do Jornal O Globo Online.